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Panorama econômico

Panorama econômico

Em meados da década de 1980, o Brasil retornou ao regime democrático, após duas décadas sob uma ditadura militar. A chapa de Tancredo Neves ganhou as eleições indiretas, e devido ao seu falecimento, o vice-presidente eleito, José Sarney, assumiu o governo em março de 1985.
Quando Sarney assumiu a presidência, a economia brasileira estava começando a se recuperar de uma recessão econômica. Em 1984, o PIB registrou um crescimento de 5,4%. Além disso, a balança comercial alcançou um superávit de US$13,1 bilhões. Nesse contexto, o cenário internacional também era favorável devido à queda do preço do petróleo, à recuperação da economia norte-americana e à desvalorização do dólar.
No entanto, o país enfrentava desafios significativos. A dívida pública havia mais que duplicado entre 1981 e 1984, tornando-se cada vez mais difícil financiar o déficit público. Adicionalmente, a inflação acelerou na década de 1980 e se apresentava como o grande problema da economia brasileira, mostrando resistência às medidas fiscais contracionistas que haviam sido tentadas até então.
Por conta dessa resistência da inflação às medidas fiscais e monetárias ortodoxas, alguns economistas concluíram que a origem da inflação resultava dos mecanismos de indexação existentes na economia brasileira. Portanto, a inflação não estava necessariamente relacionada à demanda ou aos custos.
Para combater a inflação elevada e persistente, que assolava a economia brasileira na época, foi lançado o primeiro plano econômico do Governo Sarney: o Plano Cruzado.
Plano Cruzado (1986)

Plano Cruzado (1986)

O plano Cruzado foi adotado no segundo ano do governo Sarney pelo então ministro da Fazenda, Dilson Funaro. Baseado em conceitos heterodoxos, que se contrapunham às políticas ortodoxas tradicionais de ajuste fiscal e monetário, o plano tinha como objetivo principal desindexar a economia e, assim, retirar as pressões inflacionárias do sistema de preços.
De acordo com os fundamentos do Plano Cruzado, a causa da inflação era considerada inercial, ou seja, estava ligada à excessiva indexação da economia, que perpetuava a inflação ao longo do tempo. A indexação automática de preços, salários e contratos era vista como o principal motor da persistência inflacionária, mesmo na ausência de choques externos ou pressões de demanda.
Dessa forma, para combater a inflação, Funaro propôs um “choque heterodoxo” que incluía uma série de medidas. A primeira delas foi a introdução de uma nova moeda.
A unidade do sistema monetário brasileiro passou a ser o cruzado, em substituição ao cruzeiro. A conversão de valores expressos em cruzeiros para cruzados foi fixada em mil cruzeiros para cada cruzado.
Os salários foram convertidos em cruzados com base no poder de compra médio dos últimos seis meses, ou seja, era computado o poder de compra médio entre setembro de 1985 e fevereiro de 1986 em valores correntes, a preços de fevereiro. Um abono de 8% foi dado aos assalariados de acordo com a decisão política de promover uma redistribuição de renda em favor destes, a fim de facilitar a aceitação da “conversão pela média” por parte dos trabalhadores.
Além disso, os salários sofriam reajustes anuais corrigidos em 60% da variação acumulada do custo de vida, e eram automaticamente corrigidos sempre que a taxa de inflação acumulasse o “gatilho” de 20%.
Os preços foram congelados nos níveis vigentes em 27 de fevereiro de 1986, por tempo indeterminado, com exceção para as tarifas industriais de energia elétrica. Para regular e fiscalizar o congelamento, foi criada a Tabela da Superintendência Nacional de Abastecimento e Preços (Sunab), que consistia em uma lista de preços a ser respeitada. A população era incentivada a atuar como "fiscal do presidente", denunciando os estabelecimentos que não cumprissem o tabelamento de preços. As instituições que fossem flagradas desrespeitando a tabela poderiam ser multadas, e essa prática era considerada um "crime contra a economia popular".

Fonte: Guia do Estudante

Fonte: Guia do Estudante
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Outra medida implementada foi a fixação da taxa de câmbio ao nível de 27 de fevereiro de 1986, o que contribuiu para uma maior distorção de preços internacionais.
Em relação à desindexação, a Obrigação Reajustável do Tesouro Nacional (ORTN), que era corrigida mensalmente pela taxa de inflação, foi extinta. Em seu lugar foi criada a Obrigação do Tesouro Nacional (OTN), cujo valor foi congelado até março de 1987. O uso de cláusula de correção monetária nos contratos com prazos inferiores a um ano foi proibido, exceto para os saldos do FGTS, PIS, Pasep e as cadernetas de poupança, que voltaram a ser reajustadas trimestralmente.
O plano também mudou a base do índice de preços ao consumidor (IPCA) para 28 de fevereiro de 1986, com o objetivo de eliminar a contaminação do índice pela inflação do mês de fevereiro. Além disso, o índice passou a ser chamado de IPC e seguia as mesmas ponderações do índice anterior.
Resultados do Plano Cruzado

Resultados do Plano Cruzado

Inicialmente, o plano obteve sucesso no controle da inflação. Os índices de preços ao consumidor, que estavam em torno de 15%, baixaram para praticamente zero nos meses subsequentes ao lançamento do plano.
No entanto, a inflação no Brasil voltou a subir alguns meses após a implementação do Plano. Os aumentos salariais concedidos ocasionaram em um aumento expressivo de demanda, pois elevaram significativamente o poder de compra dos trabalhadores.
O crescimento da oferta monetária resultou na diminuição das taxas de juros reais, as quais se tornaram negativas. Nesse contexto, também houve a valorização dos ativos financeiros, e a expansão do crédito.
Diante do aumento da demanda, impulsionado pela expansão do crédito, começaram a surgir os sinais de desabastecimento da economia. Isso ocorreu devido ao aumento da demanda não ter sido acompanhado por um aumento correspondente na oferta de alimentos e outros bens de consumo, resultando em problemas de escassez, desabastecimento e ágio. Além disso, a política de câmbio fixo teve efeitos negativos sobre as contas externas devido à valorização da taxa de câmbio em termos reais, gerando a diminuição das reservas internacionais.

Fonte: Terraço Econômico

Fonte: Terraço Econômico
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Em Julho de 1986, o Presidente Sarney anunciou que seria realizado um ajuste fiscal no Plano Cruzado, sem alterar o congelamento de preços. Assim, o governo desenvolveu o “Cruzadinho”, um pacote fiscal para desaquecer o consumo e, ao mesmo tempo, financiar um plano de investimentos em infraestrutura e metas sociais.
Contudo, o Cruzadinho não obteve os resultados esperados, pois mostrou-se insuficiente para reduzir o consumo e gerou poucos recursos para financiar o programa de investimentos proposto pelo governo.
O fracasso do Plano Cruzado somado à tentativa frustrada de reduzir o consumo com a implementação do Cruzadinho, evidenciou que a inflação não era apenas resultante da indexação, mas também associada ao excesso de demanda. Diante dessa ineficiência, em novembro de 1986, o governo lançou o Cruzado II.
Cruzado II (1986)

Cruzado II (1986)

O objetivo do Cruzado II, anunciado em novembro de 1986 após as eleições, era conter a inflação que havia ressurgido após o Plano Cruzado I. O governo buscou adotar uma política econômica voltada para a contenção da inflação pelo lado da demanda, através da adoção de medidas restritivas.
As medidas implementadas no novo plano envolviam o aumento da arrecadação do governo através do aumento de impostos indiretos e do reajuste de preços públicos. Como resultado dessas medidas, houve um aumento na taxa de inflação e o disparo do gatilho salarial, que era um mecanismo de correção automática dos salários sempre que a inflação acumulada atingisse 20%.
Para tentar conter o choque inflacionário, o governo elevou a taxa de juros, instituiu minidesvalorizações cambiais diárias e reindexou a economia, reintroduzindo a correção monetária mensal.
Em fevereiro de 1987, o congelamento de preços foi encerrado, e, devido à piora nas contas externas, mesmo com as minidesvalorizações diárias, o governo decretou a moratória dos juros externos. A moratória visava renegociar a dívida externa, conter a perda das reservas internacionais e gerar apoio popular.
Resultados do Cruzado II

Resultados do Cruzado II

Os resultados do Cruzado II não foram positivos. A inflação continuou a subir, e as medidas adotadas não foram suficientes para estabilizar a economia. A moratória da dívida externa diminuiu a entrada de recursos externos no país, e a confiança na economia brasileira foi abalada. O plano também enfrentou críticas por ter sido anunciado logo após as eleições, o que foi visto por muitos como oportunismo político.
Em resumo, o Cruzado II foi uma tentativa de ajuste fiscal e controle inflacionário que acabou não alcançando os resultados esperados, levando a uma maior instabilidade econômica e a uma crise de confiança no governo Sarney.
Plano Bresser (1987)

Plano Bresser (1987)

Após o fracasso do Plano Cruzado, o então Ministro da Fazenda, Dilson Funaro, foi substituído por Luís Carlos Bresser Pereira, que anunciou em 12 de junho de 1987 um novo plano de estabilização: o Plano Bresser.
Para combater a inflação, que havia sido diagnosticada como inercial e de demanda, esse plano tinha por finalidade promover um choque deflacionário na economia e corrigir os erros do Plano Cruzado, adotando uma abordagem que combinava medidas ortodoxas e heterodoxas.
Diferentemente do Plano Cruzado, o diagnóstico híbrido do Plano Bresser incluiu políticas fiscais e monetárias contracionistas, dentre elas, a adoção de juros reais positivos para contrair o consumo e evitar a especulação com estoques, além de medidas para reduzir o déficit público, como o aumento de preços públicos, eliminação de alguns subsídios e corte de investimentos públicos.
Com o intuito de evitar o desafio da defasagem nos preços públicos, foram determinados vários aumentos pouco antes da implementação do congelamento, abrangendo custos como eletricidade, combustíveis, aço, telefone, entre outros.
Pelo lado heterodoxo, houve o congelamento de preços e salários por prazo determinado. Dessa vez os preços seriam congelados seguindo 3 etapas: Congelamento por 3 meses, seguido de uma flexibilização e, por fim, o descongelamento. Os salários foram indexados à Unidade de Referência de Preços (URP), pré-fixada a cada três meses, de acordo com a inflação média. Dessa forma, pretendia-se que houvesse correções, mas que essas fossem suavizadas pela média, sem ativar o gatilho salarial.
Com o objetivo de evitar uma deterioração nas contas externas semelhante à observada nos primeiros meses do Plano Cruzado, optou-se por não congelar a taxa de câmbio. Adicionalmente, foi preciso criar uma nova Tablita - uma tabela de conversão com desvalorização diária - e estabelecer novas regras para os contratos de aluguéis.
Resultados do Plano Bresser

Resultados do Plano Bresser

O Plano Bresser conseguiu reduzir a inflação temporariamente, com uma queda significativa de 26,1% em junho para 3,1% em julho. Mas, novamente, não houve êxito no longo prazo. Em agosto de 1987, a inflação voltou a aumentar, atingindo 6,4%.
Apesar de um sucesso inicial, o congelamento de preços não foi respeitado. Sob o temor de um novo congelamento, os preços foram remarcados de forma preventiva, o que contribuiu para um desequilíbrio entre preços relativos.
Outro objetivo do Plano Bresser era a diminuição do déficit público. A intenção do plano de diminuir a taxa do déficit público para 3,5% do PIB não foi cumprida. Um dos motivos foi o aumento salarial concedido ao setor público que acabou por minar os esforços para reduzir o déficit público.
Apesar do desempenho favorável nas contas externas, resultante da flexibilização do câmbio, o Plano Bresser não conseguiu estabilizar a economia ou promover um crescimento sustentável, tendo apenas um efeito temporário na redução da inflação.
Como resultado da flexibilização do câmbio, foi observado um desempenho positivo nas contas externas. No entanto, em dezembro de 1987, a inflação atingiu 14,5%, e diante de uma significativa insatisfação popular e resistência à reforma tributária, Luís Bresser-Pereira renunciou ao cargo em janeiro de 1988, sendo sucedido por Maílson da Nóbrega.
O novo ministro rejeitava a abordagem heterodoxa dos planos anteriores, por isso, implementou uma política econômica ortodoxa gradualista, apelidada de “Feijão com arroz”, cujo objetivo principal era estabilizar a taxa de inflação em 15% ao mês, conter o aumento dos salários, e reduzir o déficit público mantendo o nível de atividade. Para isso, houve uma elevação da taxa de juros real e a adoção de uma política fiscal contracionista.
Ainda que tenha impedido uma explosão inflacionária no curto prazo, a excessiva indexação da economia brasileira fez com que a inflação continuasse a crescer, levando à necessidade de adoção de um novo plano econômico, o "Plano Verão", em janeiro de 1989.
Plano Verão (1989)

Plano Verão (1989)

Assim como o Plano Bresser, o Plano Verão foi um plano econômico híbrido, que continha elementos ortodoxos e heterodoxos. Buscando combater a inflação, diagnosticada como de demanda e inercial, o Plano conjugava medidas heterodoxas, como o congelamento de preços e da taxa de câmbio, com o receituário ortodoxo, por meio de uma política voltada ao controle da demanda agregada.
Em 1989, com a sua implementação, houve uma nova reforma na unidade monetária nacional com a criação do cruzado novo, que equivalia a mil cruzados. Antes da adoção da nova moeda, o cruzado foi desvalorizado em 18% e, posteriormente, foi fixado com uma paridade de 1:1 em relação ao dólar.
Em conjunto com a aplicação de uma política fiscal contracionista, voltada para o ajuste fiscal com o objetivo de reduzir os custos, que incluía medidas como a extinção de ministérios e programas de privatizações, o plano também introduziu uma política monetária contracionista. Esta seria executada mediante o aumento da taxa de juros real de curto prazo, restrição na oferta de crédito e elevação dos depósitos compulsórios dos bancos.
Do ponto de vista heterodoxo, houve o congelamento de preços e salários, porém desta vez sem a implementação de novas regras de indexação, e a fixação de preços foi realizada por tempo indeterminado.
Para conter o efeito de retroalimentação da inflação pela indexação de salários, a unidade de referência de preços (URP) foi extinta. Na ocasião, o governo visava pôr fim aos mecanismos de realimentação da inflação por meio de um choque de desindexação, por isso, além da URP, todos os demais mecanismos de indexação foram extintos.
Resultados do Plano Verão

Resultados do Plano Verão

Apesar de uma queda inicial no primeiro mês, a inflação voltou a subir nos meses seguintes e seguiu em rota ascendente, caminhando para a hiperinflação. Além disso, houve uma endogeneização da oferta de moeda, ou seja, a oferta de moeda passou a ser determinada pelas próprias condições do mercado, sem controle efetivo do governo.
As taxas de juros aplicadas não conseguiram conter a antecipação do consumo, impulsionada pelo receio de um aumento abrupto nos preços após o término do congelamento. Além disso, essas altas taxas de juros contribuíram para um maior descontrole nas contas públicas, aumentando o déficit nominal do governo brasileiro. Dessa forma, tanto a política fiscal quanto a monetária revelaram-se ineficazes no enfrentamento da inflação.
Soma-se a isso o fato de que o governo Sarney já estava desacreditado após diversas tentativas frustradas de estabilização, o que dificultou a implementação de medidas de austeridade fiscal, especialmente em um ano eleitoral.
Assim, o Plano Verão não conseguiu atingir seus objetivos de estabilização econômica e acabou contribuindo para o agravamento dos problemas econômicos do Brasil no final dos anos 80.
Para uma visão geral dos planos de estabilização implementados nos anos 1986-1989, confira os anexos abaixo.

Fonte: Economia Brasileira Contemporânea, Fabio Giambiagi. Páginas 128-129.

Fonte: Economia Brasileira Contemporânea, Fabio Giambiagi. Páginas 128-129.
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Fonte: Economia Brasileira Contemporânea, Fabio Giambiagi. Páginas 128-129.

Fonte: Economia Brasileira Contemporânea, Fabio Giambiagi. Páginas 128-129.
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👀 Veja como isso caiu no TPS

👀 Veja como isso caiu no TPS

IADES | TPS 2023 | Economia
A respeito do comportamento da inflação na economia brasileira na década de 1980, julgue (C ou E) os itens a seguir.


Os Planos Cruzado, Bresser e Verão empregaram somente medidas ortodoxas para combater a inflação.

IADES | TPS 2023 | Economia
A respeito do comportamento da inflação na economia brasileira na década de 1980, julgue (C ou E) os itens a seguir.


O Plano Cruzado foi inicialmente bem-sucedido na contenção da inflação, mas a inflação voltou a aumentar, após alguns meses.

IADES | TPS 2020 | Economia
A escalada das taxas de inflação nos anos de 1980 levou a diversas tentativas de controle inflacionário, consubstanciadas nos “planos econômicos” adotados no período, particularmente no governo do presidente José Sarney (1985-1990). Entre esses planos, obteve particular impacto o Plano Cruzado I (1986). A esse respeito, julgue (C ou E) os itens a seguir.


O objetivo de controle da inflação foi inicialmente exitoso, a partir de medidas de cunho heterodoxo, como o congelamento de preços, atraindo o entusiasmo e a colaboração de amplos segmentos da população.

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Apostilas Clipping ABREU, Marcelo de Paiva. A ordem do progresso: dois séculos de política econômica no Brasil. 2a edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014. GIAMBIAGI, Fabio. Economia Brasileira Contemporânea: 1945-2015. 3a edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016. Inflação descontrolada: entenda o que foi o Plano Cruzado | Guia do Estudante (abril.com.br) O congelamento de preços é uma péssima ideia, mas os políticos insistem! | Terraço Econômico (terracoeconomico.com.br)